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O meu lema desde que me iniciei nestas lides é de que só comento aquilo que vi. Ou seja, analiso e passo em revista as notas que fui tomando nas corridas em que marquei presença ao longo da temporada e que, neste ano, até foram poucas. O que não me impede de ter uma opinião muito concreta sobre o toureio que vi praticar a cavalo.
Em Portugal, a dita Pátria do toureio a cavalo, muito se imita o que vem de fora e muito pouco se aprimora aquilo que sempre foi o toureio à portuguesa, das sortes à tira bem desenhadas, das sortes de caras, do deixar vir o toiro de praça a praça e conseguir reuniões ajustadas e grandes ferros. Tudo isto num conceito de lide em que a brega é feita sem dobrar em curto em demasia os toiros, em que os remates não são exagerados e levando os toiros por direito e por aí fora. E tudo isto feito apenas com a mão esquerda nas rédeas, a direita para segurar e cravar a farpa, com as pernas bem postas…
Neste momento em Portugal, imita-se demasiado o que os estrangeiros fazem sem cuidar de que as cópias nunca são melhores que os originais. As duas mãos estão quase sempre nas rédeas, mormente quando se fazem os galopes/ladeios a duas pistas, seja na preparação das sortes seja no remate das mesmas. E se tomarem atenção, na generalidade das vezes, não tiram o toiro de tábuas e qualquer terreno lhes serve para tentar deixar o ferro. Muitas das vezes lidam o toiro em terrenos que nada favorecem o êxito da lide ou que permitam maior brilho às sortes. Tudo tem que ter conta, peso e medida.
O bom toureio consiste, basicamente, em dar ao toiro a lide que o mesmo exige. E muitas das vezes o que vemos são os artistas em busca de terrenos que não são os mais idóneos, ou que tentam colocar o toiro nuns terrenos onde não investe, ou porque só querem fazer câmbios e o toiro não serve para essa modalidade mas continuam a insistir, e assim sucessivamente. Vi este ano uma lide que resumiu tudo aquilo que é a lide que o toiro exige.
Um toiro que começou desde cedo a fixar-se nas tábuas, saindo daí com alguma dificuldade. O cavaleiro tentou por duas ou três vezes tirá-lo desses terrenos e procurou deixá-lo nos médios. Como tal não resultasse, cravou-lhe dois curtos a sesgo que o obrigaram a deixar de procurar esse refúgio de tábuas. O cavaleiro soube usar os melhores recursos da montada e, ao mesmo tempo, sem maçar o público, dar a volta ao toiro mostrando-lhe que em tábuas também podia com ele e lhe ia dar luta. E o toiro cresceu ao castigo e o cavaleiro conseguiu uma grande actuação sem ter de utilizar outros argumentos como fossem os ferros de violino, muitas passagens a ladear pela cara do toiro, etc, etc… Deu-lhe luta e venceu, dentro de um estilo clássico e à portuguesa, sem concessões a novas modas.
Depois vemos outros cavaleiros que, por tudo e por nada, lá vai ladeio com as duas mãos nas rédeas, esporas sempre a funcionar, sem souplesse, mal colocados na sela mas sempre a receber aplausos do conclave. Mas que, na generalidade, não acrescentam nada ao que podem e devem fazer para triunfar. Se todos fazem tudo igual… o que há que os distinga???
Se virem algumas actuações de outros toureiros a cavalo, verificam a diferença nos andamentos, a ausência de toques excessivos das esporas, apesar das duas mãos nas rédeas. Mas onde há souplesse e nada parece forçado…. Assim como alguns ares de escola são uma mais-valia em algumas actuações mas sempre na justa medida.
Nos dias de hoje parece que se privilegia mais o acessório do que o essencial. O essencial é a boa brega, é o domínio suave das montadas, é o cuidar das sortes procurando dar vantagens ao toiro, provocá-lo de largo, aguentar a investida e abrir o quarteio o mínimo necessário para cravar com limpeza, sem toques. E quanto mais ajustada a sorte for, maior será a verdade e o impacto que irá criar junto do espectador. E rematar as sortes rodando pelo pitón de saída devagar e com classe. Quando se toureia assim, com verdade, o público reage positivamente e entende o que se passou nesse momento crítico da reunião, não necessitando dos ferros de palmo ou de violino para dar importância ao que o artista acabou de fazer. Como remate justificam-se esses ferros? Claro que sim, desde que não sejam para limpar uma actuação de menor valia.
Os dois conceitos de toureio que marcam nos últimos anos cada temporada, ou seja o toureio mais clássico e sem concessões à bancada e o outro toureio mais de proximidade entre cavalos e toiros, com os tais ladeios ou galopes a duas pistas, com remates com piruetas, com momentos quiçá mais artísticos, têm pleno cabimento e provocam essa grande divisão de opiniões, sempre benéficas para o sucesso da festa desde que as pessoas se limitem a opinar sobre o essencial: o toureio.
É óbvio que uma grande actuação de um grande clássico será sempre recordada pelos mais puristas do toureio. E que os outros sempre recordarão aqueles muletazos a cavalo que os outros mais revolucionários conseguem com a doma das suas montadas e alguns tipos de toiros. Temos é de ser genuínos: os portugueses devem tourear de acordo com as bases essenciais do seu toureio e procurar não imitar o toureio dos rejoneadores e que pode ter momentos de grande espectacularidade mas…
Devo dizer, para terminar este artigo de opinião, que vi grandes momentos de toureio a cavalo em 2016 e que me emocionaram algumas dessas lides. E para que não restem dúvidas (algumas crónicas foram publicadas aqui no OLÉ e outras apenas no blog Barreira de Sombra), elegi 10 lides que marcaram a minha temporada, algumas delas da autoria de rejoneadores. A saber: João Ribeiro Telles (Almeirim, 29/05); Rui Fernandes (Santarém, 10/06); Ana Batista (Caldas da Rainha, 11/06); Pablo Hermoso de Mendoza (Lisboa, 02/06); João Moura (Lisboa, 28/07); Andy Cartagena (Abiul, 06/08); Duarte Pinto (Arruda dos Vinhos, 16/08); Diego Ventura (Moita, 13/09); Moura Caetano (Moita, 13/09); João Moura Jr (Lisboa, 08/09) e Parreirita Cigano (Lisboa, 13/10).